domingo, 2 de agosto de 2015

Deborah




Querida irmã, que há tempos não contacto, saudades tuas...
Não digo que há tempos não a vejo, pois a tenho visto sempre nas minhas lembranças!
Vejo que choras, pareces tão triste...
Da última vez que você me viu, eu usava um vestido branco, com bordados azuis, desgrenhado e sujo de minhas andanças no quintal; sempre amei a natureza, como sabes, e amo-a ainda mais aqui de onde posso ver a verdadeira grandiosidade da teia da vida.
Eu ainda era uma jovenzinha, mas de lá para cá, cresci tanto, e como queria que me visses agora!
Como eu poderia ir embora tranquila, deixando-te assim?
Imaginando-me só, te escondes dos outros... 
Pensando-me pra sempre perdida, te proíbes o riso, ofereces teu corpo à inércia.

Lembro-me de como era nosso inverno, uma sucessão de dias sombrios, cinzentos, amargos...
E foi num desses dias que peguei a câmera que me deste, e saí a fotografar aquelas paisagens desmaiadas na tristeza da chuva e do frio.
E foi quando olhei as fotos que percebi algo que não havia visto antes, no olhar panorâmico que eu lançava às coisas:
Ela estava lá, pequena flor que se misturou à imagem e que em sua humildade não se sobressaiu...
Por brincadeira, fui fotografando assim, a esmo, tudo o que via...
E em cada canto a vida teimava em viver.

Mesmo no guarda-chuva esquecido no banco, havia ainda a mão de quem lá o deixou. Na vila pobre, as crianças sorriam...
Acho que foi assim que me chamou a atenção a lágrima que em teu rosto rolava.
Em meio a todo o espaço por onde agora eu poderia planar, aquela pequena gota de prata paralisou-me...
E vi que em meio à vida, havia dor.

Irmãzinha, eras a mais velha...mas agora, ao contemplar todas as vidas que já tive, vejo-me eu a mais velha, a mais experiente, e apta a te consolar, assim como me consolavas quando eu não entendia as asperezas da vida. Mas pra isso, querida menina, preciso que te permitas ser confortada, não bloqueando teu coração com tanta tristeza, a ponto de eu não conseguir te atingir com meus pensamentos de amor. Um dia, vais me ver com teus olhos novamente, e eu te direi que valeu a pena a breve separação que me deu tempo de amadurecer para oferecer a ti e aos outros um coração mais sábio. Essa é a pessoa que eu desejo ser...como ainda não posso sê-la, ao menos me cerco das coisas que ela faria. Eu trabalho, eu coopero, eu estudo. E te espero.

Agora deixa-me partir. Sou uma andorinha...!
Olha pra mim com toda tua alma: sinta meu olhar e minha bênção, pois antes desta carta terminar, quero ver a luz azul dos teus olhos. Esse será o farol que me guiará a ti, quando aqui chegares.

Um beijo de beija-flor...da tua irmã
Deborah


Bíndi